Com a ascensão da inteligência artificial generativa (GenAI), eu tinha essa curiosidade mórbida de quanto tempo levaria para surgir um jogo feito 100% de AI slop. Alguns estúdios já admitiram que usaram GenAI em partes pontuais do processo de desenvolvimento, mas o que eu queria era ver alguém que tivesse a… “coragem” de fazer um jogo todo através de inteligência artificial. Minhas preces (infelizmente) foram atendidas, pois agora Codex Mortis existe.
Na verdade o jogo já havia sido anunciado há algum tempo. A demo saiu tem mais ou menos um cinco dias, porém fiquei sabendo apenas hoje enquanto passeava pelo Reddit. Imaginem o quanto NÃO fiquei surpreso em saber que esse tal de Codex Mortis nada mais é do que um dos clones mais descarados de Vampire Survivors. É tão óbvio que chega a doer. E pra mim fica ainda mais particularmente engraçado porque dois dias atrás eu falava como Vampire Survivors foi um erro pela maldição de jogos survivors-like que ele trouxe pro cenário indie. Uma tecnologia que essencialmente copia trabalho dos outros usada para fazer um jogo que também em essência é uma cópia de cópias? A piada nasceu pronta!
Como consta na sua descrição, Codex Mortis é um jogo com“desenvolvimento 100% impulsionado por IA”. Código, texto, artes, trilha sonora, etc., até mesmo o seu trailer cinematográfico é a coisa mais saída do Sora que poderia existir. Por que seria diferente, né?
Mesmo assim eu tenho sérias dúvidas sobre a afirmação do desenvolvedor – que atende pelo pseudônimo de Grolaf, já que nenhum trambiqueiro é burro de assinar seu nome num projeto desse – de que Codex Mortis é todo feito por IA. Com certeza ele precisou fazer ajustes aqui e ali no código, além de outras partes do jogo, para garantir que ficasse apresentável e funcional. O “100% AI [Slop]” está lá para fins de marketing porque matérias com “primeiro jogo do mundo feito totalmente com IA” já rolam pela internet. Não é difícil imaginar o motivo. Em circunstâncias normais, Codex Mortis seria apenas o enésimo survivors-like que cai toda vez que você balança uma árvore na Steam e não renderia mais do que uma nota de rodapé.
Pois bem, se esse jogo tudo que eu mais desprezo no mundo por que resolvi fazer propaganda gratuita para ele aqui no meu blog? Inclusive deixo aqui a sua página na Steam para todos aqueles que quiserem colocá-lo na lista de desejo ou então baixar a demo. A resposta é simples: porque eu quero que Codex Mortis tenha o máximo de exposição possível.
De verdade, quero que a notícia sobre a existência desse jogo circule o mundo todo. Espero que cada veículo de informação dedique um ou mais artigos sobre Codex Mortis e torço também para que todo streamer faça uma live testando a demo. Quero abrir o Twitter um dia e vê-lo ali nos trending topics. Num mundo mais-que-perfeito ele deveria ser o último anúncio do The Game Awards, com o miliciano Geoff Keighley falando dele com um sorriso de orelha a orelha. Quanto mais pessoas souberem da existência desse jogo, MELHOR!!!
Exaltações à parte, eu realmente acho que todo mundo deve conhecer Codex Mortis. Pra mim, esse é por enquanto o jogo que mais escracha a mediocridade criativa dos usuários GenIA. Textos, imagens, vídeos e agora jogos. Pois esse papinho de como a GenIA veio democratizar a arte e elevar o potencial dos artistas é pura conversa fiada para deslumbrar tech bros. E desconfio que essa galera sabe muito bem disso, pele menos inconscientemente. Não é à toa que, quando começam a avacalhar qualquer arte IA, o que sobre para os tech bros é mergulhar no copium. “Isso é apenas o começo”, “a IA vai se desenvolver mais”, “a tecnologia evolui rápido”, “só mais 72 horas, patriotas”.
Entra mês, sai mês e vemos as mesmas promessas sobre como a GenIA vai conseguir produzir coisas no mesmo nível de artistas reais. Mas até o momento tudo que vimos são as maiores fubanguices já produzidas por uma pessoa iludida na sua própria mediocridade. Sim, coleguinha, muito massa esse seu vídeo dos bastidores de um live action de Dragon Ball* com atores do mainstream hollywoodiano. Que pena que o Akira Toriyama não está aqui para ver essa incrível homenagem à obra dele que você produziu. Com certeza ele iria amar!
*Tem nada a ver com o texto, eu só queria ilustrar o quanto eu detesto essas porcarias de vídeos de IA que infestam as redes sociais hoje em dia.
Contudo, não vim aqui vilanizar a inteligência artificial na sua totalidade. Estou ciente que ela tem suas aplicações reais e pode trazer benefícios na área de análise de dados, medicina e por aí vai. Porém estou falando no seu uso das artes e, até o momento, não apareceu nada que não merece mais do que escárnio. Codex Mortis não é uma exceção e para mim é o o seu maior símbolo. Acho muito engraçado ver alguém se dispor a fazer um jogo “somente” com IA, seja com ou sem a intenção de mostrar o potencial da tecnologia e no final das contas o que o tal do vibe coding consegue gerar é isso:
Pronto, podemos dormir tranquilos. A fantástica GenAI conseguiu esse nada saturado e tão artisticamente complexo nicho dos clones de Vampire Survivors. Até porque não é como se qualquer desenvolvedor júnior consegue fazer um jogo desse porte com um conhecimento moderado de Unity durante suas férias de fim de ano, né? De forma alguma o Grolaf é um trambiqueiro que usou o atalho mais preguiçoso para produzir um jogo rápido num subgênero cuja fanbase parece ser capaz de consumir qualquer coisa e achar fantástico.
Eu não sei para quem isso é mais desmoralizante: os defensores da GenIA ou a galera que só joga survivors-like. Dado o tom do texto vocês já devem saber a minha opinião. Survivors-like apesar de ser um subgênero que eu considero crativamente estagnado, ainda reconhecço que os desenvolvedores se esforçam para criar uma estética para seus jogos e pelo menos pensam em alguma gimmick.
Por outro lado, para a GenIA, a reação que fica é a de “só isso que você consegue fazer?”. O pior é que meu pessimismo me faz pensar que é capaz de Codex Mortis ser um sucesso. Não só pelo fator curiosidade, mas porque eu acredito que vai ter uma galera que nem vai perceber que é um jogo feito por IA. Se até Megabonk cai nas graças dessa galera, talvez Codex Mortis consiga conquistar sua parcela de público também. Da minha parte, não vejo a hora de poder pirateá-lo para poder rir dele com propriedade.
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