Nos anos 70, o prolífico mangaka Go Nagai deu sua contribuição para o já estabelecido gênero dos mechas com seu mangá: Mazinger Z. Inspirado por obras como Tetsujin 28-go, de Mitsuteru Yokoyama, e Astro Boy, de Osamu Tezuka, Go Nagai ajudou a propagar o que hoje conhecemos como super robot. Para os padrões de hoje, Mazinger Z teve um curto período de publicação. Ele iniciou em outubro de 1972 e terminou com 5 volumes em setembro de 1974. Contudo, o seu nome persistiria por anos a fio com sequências, adaptações e linhas de brinquedo que perduram até hoje.
E recentemente eu li esse clássico.
Já mencionei aqui que estou num processo de me tornar um fã de Gundam. Esse é um gênero, o famigerado real robot, é bem diferente do que Go Nagai ajudou a popularizar na sua época. Hoje eu ando explorando-o através das séries mais antigas de Mobile Suit Gundam. No meio dessa aventura eu acabei tendo vontade de sair um pouco desse real robot e dar uma olhada no outro lado. E foi assim que fui parar no clássico Mazinger Z cujo nome eu já tinha ouvido várias vezes. Admito que o original não clicou comigo e explicarei isso no próximo tópico. Porém, futucando na internet para saber mais sobre o mangá e o seu legado, eu me deparei com a seguinte abertura:
Claramente não parecia uma produção setentista. A energia da música tema me fez relembrar o clássico moderno Tengen Toppa Gurren Lagann, que até então era um dos poucos títulos de mechas que eu tive o extremo prazer de assistir. Logo fiquei mais curioso. E assim fiquei sabendo da existência desse animê de 2009 chamado Mazinger Edition Z: The Impact!
Uma nota rápida: daqui para frente eu vou me referir ao desenho pelo seu nome da linha de brinquedos, Shin Mazinger Impact Z. Apenas porque eu gosto mais desse título.
Para leigos como eu era até umas semanas atrás, essa é uma reimaginação do mangá original de Go Nagai. Essa adaptação incorpora elementos de outras obras dele, sobretudo um mangá de 1998 chamado… Z Mazinger. No caso, este mangá é outra reimaginação de Mazinger Z (Jesus, que confusão!) que utiliza alguns temas da mitologia grega na sua história. Como eu não consegui encontrar uma versão em inglês de Z Mazinger para ler – e confesso que não investi muito tempo procurando – não sei afirmar exatamente quais elementos fazem parte desse mangá e quais são originais a Shin Mazinger Impact Z. Contudo, dentro dessa ignorância, me darei a liberdade de dizer que ele faz um bom trabalho adaptando essa versão.
Baixado e assistido durante o meu recesso de dezembro, Shin Mazinger Impact Z se tornou um dos animês cuja experiência mais me divertiu nos últimos anos. Ele não chega a ter a mesma emoção que Gurren Lagann me entregou. Até porque esse é um nível quase que impossível de se alcançar! Entretanto, ele chegou bem perto e eu me via gritando ROCKETO PANCH!!! a todo momento junto com o protagonista.
Tanta diversão é digna de um texto próprio, ainda mais que ultimamente eu tenho sido mais otaku do que gamer. Então, sem mais delongas, bora pro texto.
REESTRUTURANDO UM CLÁSSICO
Vou ser sincero com vocês, eu entendo e reconheço que Mazinger Z é um clássico. Porém entender e gostar são duas coisas diferentes. Eu não acho ele um bom mangá! E não acho nem que é um caso de “pra época era bom” porque eu não acredito que qualidade, qualidade verdadeira, diminui com a passagem do tempo. Frescura, por outro lado, costuma aumentar. Ao mesmo tempo também não acho Mazinger Z é ruim, eu até gosto da sua proposta. O problema é que ao meu ver o Go Nagai não tinha a menor ideia do que ele queria fazer com esse negócio.
Dentro do fandom de Mazinger, é uma anedota bem conhecida que o Go Nagai criou o conceito do mangá quando estava preso num engarrafamento e teve a vontade de ultrapassar os carros pilotando um mecha.
Depois de ler o original de cabo a rabo a impressão que eu fiquei é isso mesmo, que não passava de uma história inventada durante o ócio do trânsito. Me parece que depois de ter criado o conceito inicial, o autor foi só desenhando conforme ele imaginava sem pensar muito na estrutura da história. Por isso que tudo no universo de Mazinger Z, desde o próprio robô e os vilões, até mesmo o mais próximo que temos de plot points, parece ser muito jogado no mangá. Não é à toa que a história simplesmente para depois de um grande confronto entre o protagonista, Koji Kabuto, e um dos seus principais antagonistas, Barão Ashura. É quase como se o Go Nagai cansou de desenhar o Mazinger e decidiu passar para um novo projeto.
Shin Mazinger Impact Z já são outros quinhentos!
O que essa reimaginação faz, e faz muito bem, é pegar todos os elementos que eram apenas jogados no Mazinger Z original amarrá-los num mesmo contexto. Isso dá mais coerência ao roteiro e mostra que há de fato um planejamento para o quadro geral da história. Tanto é que o primeiro episódio já tasca na conclusão, inicialmente te deixando confuso. Mas isso mostra que a série já sabe bem pra onde ela queria caminhar com a sua trama e personagens.
Aqui os robôs dos vilões não são apenas máquinas que eles convenientemente encontraram numa ilha. Agora elas são relíquias de uma civilização antiga cujo lore serve de motor para o conflito entre os personagens do Dr. Hell e Juzo Kabuto, avô do protagonista, e serve até de plano de fundo para outros personagens. O já citado Barão Ashura ganha uma nova origem que o conecta mais diretamente a trama e enriquece o personagem em vez de ser um mero capanga do Dr. Hell.
A história adiciona novos conceitos e personagens e o animê consegue costurá-los perfeitamente não só ao roteiro dessa versão de Mazinger Z, como também histórias do mangá original. O que antes era uma bagunça de experimentação, agora fica mais coeso e bem direcionado. Nesse sentido, eu digo que até vale a pena dar uma checada no mangá de 1972. Ele torna a experiência desse animê mais satisfatória já que você consegue observar como as decisões tomadas melhoram o original.
Entretanto há algo que eu preciso pontuar. Shin Mazinger Impact Z não faz “mais sentido” que o mangá de Go Nagai. Ele não tem qualquer compromisso em ter uma lógica e muito menos uma base científica sobre o funcionamento dos robôs. Porém dentro do seu absurdo ele está mais organizado e coerente com esse tipo de história de super robot. Assim, ao meu ver, funciona muito melhor que o clássico que o originou.
MENOS RAZÃO, MAIS EMOÇÃO
Ao dizer que Shin Mazinger Impact Z não tem compromisso com uma lógica eu estou pensando Gurren Lagann. E o que é Gurren Lagann se não emoção pura que não está nem aí se algo faz ou não sentido prático? Esse é um animê que tem zero interesse no que pode ser real, até mesmo dentro da flexibilização que a ficção nos permite em relação a mechas. Pouco importa como o Lagann funciona de fato em termos científicos. É completamente fantasia! Não é a toa que no final nós estamos vendo robôs, que se chamarmos de titânicos seria um eufemismo, que lutam lançando GALÁXIAS um nos outros. E a gente adora cada segundo!
Isso porque o que move Gurren Lagann, tanto o robô quanto o próprio animê, é a paixão, é a emoção, é aquela força intrínseca humana que palavras não podem descrever tão bem. É sentir, não é entender. Shin Mazinger Impact Z não chega nas proporções galácticas de Gurren Lagann, mas é notável que ele segue a mesma abordagem do seu contemporâneo.
E isso vem do original.
O gênero de super robot tem muito mais a ver com super-heróis do que de fato robôs pilotados como num Gudam da vida. Então dane-se se existe qualquer coisa base científica sobre o Japanium ou a Photonic Energy. Ao menos na forma que a história a aborda. O que importa é a emoção com que o dublador do Koji grita ao usar um dos poderes do Mazinger: Rocket Punch, Rust Hurricane, Breast Fire e BIG BANG PUUUUUUUNCH!!!
Você não está assistindo Shin Mazinger Impact Z porque quer um roteiro mega intrincado que explore a complexidade da natureza humana e nos faça questionar nossas visões sobre a realidade. Você quer ver um robozão enfrentando outro robozão, com uma trilha sonora que te encha com aquilo que na modernidade chamamos de hype.
Mas como eu falei anteriormente, o desenho faz todo sentido dentro da lógica absurda desse universo. E os personagens por mais caricatos que sejam, tem um pouco de humanidade com a qual podemos nos simpatizar e nos importar com eles. Desde a família do Koji, onde agora a morte do avô realmente tem um peso e não é apenas descartado no primeiro capítulo, até vilões como Barão Ashura que se torna uma figura muito mais trágica nessa versão. Personagens novos são igualmente carismáticos como os fantásticos Kurogane Five e a Tsubasa Nishikiori. Essa última que por vezes é mais protagonista que o próprio Koji, tendo até mais camadas e uma conexão mais profunda com a trama do que o nosso herói.
Apesar disso, é óbvio que o animê investe muito mais nas emoções do que nesse lado racional e ele te prende justamente pelos sentimentos e a animação toda que cria dentro de você. Como eu gosto de dizer, se eu tivesse que resumir Shin Mazinger Impact Z em duas palavras seriam:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Eu não quero que as pessoas pensem que o Shin Mazinger Impact Z é aquele tipo de história que você tem que desligar o cérebro. Primeiro porque eu odeio esse termo e segundo porque isso nem se aplicaria a ele. Dentro do seu absurdo, o desenho e perfeitamente coerente.
Personagens são caricatos e tem reações exageradamente teatrais e isso de forma alguma é um demérito. Essa é a graça do desenho! Como tudo na arte, depende da proposta e aqui a abordagem de Shin Mazinger Impact Z funciona direitinho. A energia dele vai te contaminando pouco a pouco e logo você se vê gritando, pelo menos mentalmente, os poderes juntos do protagonista.
É um estado de animação constante, sem nunca perder o fôlego, cada episódio move a trama para frente e te mantém preso a esse hype do começo ao fim. Vai, Mazinger!
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