
Nessas últimas 48 horas passou a circular por aí um estudo da Pesquisa Games Brasil chamado “GTA VI: Hype, consumo e cultura gamer“. O título fisgou a minha atenção porque já tem um bom tempo que considero que o centro da cultura gamer não são os vídeo games, é o hype. A qualidade, a experiência, aquilo que torna o jogo tão especial entre os demais importa muito menos do que a expectativa gerada ao redor dele. Atualmente não existe um público com a expectativa mais alta do que os fãs de GTA, então essa era uma oportunidade perfeita para observar essa dita cultura.
O estudo da Pesquisa Games Brasil trouxe muitos dados interessantes. Para mim, o mais importante é sobre a grande quantidade de otários que existem nessa comunidade. Calma, fãs de GTA! Eu não acho que todos vocês sejam otários, ok? Somente um terço! 33,2% para ser mais exato. Você pode buscar conforto pensando que está nos outros dois terços. Então agora que as ofensas gratuitas foram feitas, vamos aos dados.
A pesquisa só está disponível para assinantes da PGB Data Insights, mas felizmente já tivemos vários artigos. O site Meu PlayStation, por exemplo, falou sobre essa alta expectativa pelo GTA VI. Quase metade dos entrevistados (49,3%) pretendem comprá-lo no lançamento e mais de um quarto (25,3%) já até trocaram seus aparelhos para garantir que conseguirão rodar o jogo. Porém outros sites como a Voxel, Folha de S. Paulo, IGN e Flow Games (além deste blogueiro pilantra aqui que vos fala) preferiram focar no dado que certamente gera as manchetes com mais cliques: 33,2% dos entrevistados acham que seria justo se GTA VI custasse R$600,00. Outros 29,2% consideram que esse preço seria muito caro e os outros 37,6% que ninguém se importa com o que responderam.
Tudo isso dá para tirar de um dashboard que você provavelmente já viu rodando aí pelas redes sociais e fóruns nos próximos dias:

Apesar daquele meu comentário inicial, juro para vocês que eu não tenho nada contra os fãs de GTA. Não condeno essa hiper empolgação, até porque eles não conhecem nada melhor para jogar. Eu disse que não tenho nada contra, não que deixaria de ser condescendente. Se você gosta de uma franquia e conseguiu juntar uma grana para comprar o próximo jogo dela no lançamento, seja feliz. O único real problema que eu tenho nessa história são com aqueles 33,2% ali que estão justificando antecipadamente um preço que – por enquanto – só existe no campo das ideias.
A história que GTA VI poderia custar R$600,00 surgiu no começo do ano, se não estou enganado, e não passa da mais pura palpitagem. Foi só mais um dos casos de “analista diz que…” de alguma empresa de investimentos querendo ganhar destaque na mídia. Meses atrás tinha outra falando que GTA VI poderia arrebentar todos os recordes e gerar 7,6 bilhões de dólares em 60 dias. Infelizmente essas análises freestyle funcionam bastante porque o gamer vive de formar opinião com base em rumores.
Entra mês, sai mês e surge um “insider” de dentro de uma caverna, soltando alguma historinha sem qualquer materialidade que um gamer bestão vai pegar para criar uma postagem em alguma rede social ou fórum e perguntar “o que acham disso?”. Não precisa ser provável, não precisa nem ser possível, só precisa ser jogado na roda. É assim que a gente termina com um rumor virando pergunta uma pesquisa séria.
Mas o que me incomoda não é saber que existem fãs de GTA dispostos a pagar R$600,00 pelo jogo. De novo, o dinheiro é seu. Se o ganhou honestamente, faça o que bem entender com ele. O que me pega é a forma como a questão foi colocada. Não foi “você pagaria R$600,00?”, foi “você acha justo custar R$600,00?”. Isso por um produto que essa galera ainda não tem a menor noção de como vai ser para além de dois trailers (medíocres, diga-se de passagem). Esses gamers já se convenceram que GTA VI, ou pelo menos querem acreditar que será. Essa talvez seja uma das maiores façanhas do capitalismo: conseguir com que o consumidor dê direito a empresa de cobrar mais caro dele.
Esses 33,2% de entrevistados não disseram apenas que eles pagariam 600 contos caso GTA VI viesse a custar tal valor. Eles estão olhando para a Rockstar e falando que ela está CERTA em cobrar esses 600 contos. Foi mal, mas isso não é ser fã. Isso é ser otário!
Ano passado rolou um bafafá em torno de Hellblade II pelo fato do jogo custar uns R$230,00 e ter em torno de umas dez horas de gameplay. Naquela época eu interpretei a reação como parte de uma angústia que o gamer sente pela consciência que vídeo game nunca vai ficar mais barato. Não é nem mais uma questão local, para evitarmos de repetir o mantra d “vídeo game sempre foi caro no Brasil” que fez o gamer acreditar que é só aqui que as pessoas reclamam de preço.
Durante aquela ocasião, talvez até antes dela, que eu passei a reparar essa nova tendência de gente buscando formas de justificar o preço para si. Já até comentei mais de uma vez de ter esbarrado com uns gatos pingados comentando sobre como o preço de jogos poderia ser proporcional ao tempo de gameplay. Faz sentido, né? Afinal o que define o valor de um jogo é quanto tempo você pode passar dentro dele, né? Seria muito bom aplicarmos essa metodologia de preço, porque empresa nenhuma inflaria artificialmente o jogo para poder cobrar mais da gente, né?
Pois bem, eu já estou calejado de ver gamer buscando formas de justificar o preço de um jogo para si. O que eu não esperava é que isso iria piorar ao ponto do gamer imaginar que um jogo virá custando o olho da cara e ele mesmo arrancar de bom grado. “Toma, Rockstar! É pra você fazer mais GTAs”. Que loucura, bicho! Mas não se aflijam, fãs de GTA. Tenho certeza que vocês não são os únicos otários dessa comunidade, só são aqueles que temos alguns dados estatísticos para inferir isso!
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