Nas últimas semanas, com exceção de uma pequena polêmica besta de gamer reaça, a maré estava boa para Black Myth Wukong. O jogo foi um enorme sucesso de vendas, teve uma recepção positiva e conseguiu bater o recorde de Palworld de jogadores simultâneos na Steam. Assim uma parcela da comunidade já tinha se convencido: GOTY. Porém, nesses últimos dias, tivemos o lançamento de Astro Bot. O jogo é só elogios, aclamado tanto pela crítica quanto pelos jogadores.
Então o gamer vai lá mais uma vez: não tem jeito, é GOTY!
Não posso dizer que isso me surpreendeu. Em agosto do ano passado eu escrevi ‘Baldur’s Gate 3 e o GOTY mensal‘. Nele falo sobre esse padrão em que e todo mês os gamers elegem um novo jogo do ano. Não digo um novo candidato o GOTY do The Game Awards e sim aquele que deveria ganhar o prêmio. Mais ainda do que em 2023, esse é um título que já perdeu todo seu sentido e eu sou da crença que ele nunca teve um para início de conversa. Contudo é notável como as discussões sobre jogos não conseguem se desprender desse rótulo.
Pois bem, sabemos que – ou pelo menos acho que sabemos – vídeo games vivem sob o domínio da cultura do hype, auxiliada por campanhas de marketing agressivas e um FOMO que assombra esta e mais outras comunidades. Entretanto, essa cultura vai além de uma mera exaltação por um futuro lançamento. Quem dera fosse apenas isso. Meu Deus como eu queria que fosse apenas isso! O hype se manifesta na própria forma que falamos sobre os jogos, com muitas expectativas irrealistas e um discurso tomado por extremos.
O Black Myth Wukong foi uma vítima disso. Cansei de ver tweets e publicações no Reddit tratando esse jogo como a segunda vinda de Cristo. Faziam parecer que o sucesso do jogo era algo sem precedentes. Teve gente com a coragem de chamá-lo de underdog. Nem parece que o jogo contava com um mercado chinês gigante, uma antecipação que vinha de anos e que surfava uma tendência de gameplay que há mais de década se mostra popular e lucrativa. Teoricamente não existe motivo para tratá-lo com tanto exagero, mas na prática é diferente. Essa é uma comunidade que PRECISA do exagero. É GOTY ou nada!
Isso não é uma exclusividade de Black Myth Wukong. É um dos padrões mais recorrentes nesse comunidade. Por isso que Astro Bot, poucos dias depois do seu lançamento, já tinha ao seu lado uma multidão de jogadores afirmando que esse é o GOTY. O espírito coletivo do gamer tem uma memória que se reinicia sempre que um novo jogo toma o centro dos debates na internet. Se bobear, antes mesmo de setembro terminar a gente vai ter outro recebendo a alcunha de GOTY e essas pessoas vão se esquecer de Astro Bot até que o The Marketing Game Awards anuncie seus candidatos.
Eu me incomodo com esse tipo de coisa porque para mim ela prejudica o discurso sobre jogos. Já era insuportável ver o pessoal tratando metascore como certificado de qualidade e agora temos que lidar com uma “gotyzação” de todo lançamento que caia nas graças do povo. Como é que a gente vai ter uma discussão com o mínimo de nuance quando o gamer só sabe se comunicar em extremos? Não, pior. Essa comoção exagerada não remove a nuance da equação, ela esvazia todo o debate. Astro Bot provavelmente é um jogo da horinha. Porém como eu vou conseguir acreditar de verdade que ele é esse jogo tão fantástico que as pessoas estão gritando aos quatro ventos se até ontem estavam dizendo o mesmo sobre outro título?
Esse texto está virando uma espiral porque é isso que se tornou falar de vídeo games, uma constante repetição dos mesmos comentários:
Prince Of Persia: The Lost Crown? Pô, vai ser GOTY!
Tekken 8? Ah, esse é GOTY!
Helldivers 2? GOTY, claro!
Final Fantasy VII Rebirth? GOTY fácil!
Elden Ring: Shadow of the Erdtree? É DLC, mas acho que é GOTY!
The Legend of Zelda: Echoes of Wisdom? Nem lançou ainda, porém vai dar GOTY!
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