Há poucos dias tivemos o lançamento do aguardadíssimo Baldur’s Gate 3, mais novo título da série de RPGs de longa data baseada numa das campanhas mais populares de Dungeons & Dragons. Os jogos de Baldur’s Gate já passaram por diversos estúdios e esse último é de autoria da Larian Studios, desenvolvedora da menos conhecida série de Divinity. Ao que parece, a Larian Studios acertou bastante e Baldur’s Gate 3 agradou muito a crítica e, sobretudo, jogadores. Uma ótima notícia para entusiastas do combate por turnos. Atualmente ele já consta como um dos jogos mais populares da Steam de todos os tempos.
O Twitter já decretou que é GOTY. Só que tem um detalhe: isso aí já aconteceu sete vezes só esse ano!
Em janeiro a alcunha era de Hi-Fi Rush. O seu lançamento repentino foi uma grata surpresa para muitos jogadores que já achavam que ele seria o melhor jogo de um ano que mal tinha começado. Mas isso durou pouco porque no mês seguinte veio Hogwart’s Legacy. Ele teve sua parcela de polêmicas graças a autora da obra original, mas como era o jogo que fãs de Harry Potter sonhavam há anos, alguns decidiram passar para ele o título de GOTY. Porém isso também não foi longe, afinal em março tivemos o remake desnecessário de Resident Evil 4 que tomou os trending topics e a paz do Davy Jones por umas semanas. Ali já tínhamos o terceiro game of the year… of the year!
E assim se repetiu consecutivamente até chegarmos em agosto com Baldur’s Gate 3, o mais novo sucesso games que configura o oitavo GOTY de 2023. E olha que falo em oitavo apenas porque estou chutando para baixo. Fui apenas puxando esses nomes aí da memória e checando se as datas de lançamento estavam na ordem certinha. Não tenho dúvidas que em algumas ocasiões começamos o mês com um GOTY e terminamos o mesmo com um segundo, quem sabe até um terceiro só naquele. O ponto é: toda hora escolhem um GOTY diferente.
Antes de prosseguirmos é bom fazer algumas pontuações porque eu sei como a internet funciona.
Primeiro, é óbvio que não se pode esperar que um jogo fique no centro das atenções por muito tempo. Ainda mais numa geração de consumo rápido como a nossa. Também há de se levar em conta que algumas pessoas usam GOTY mais como meme do que como se ele fosse algo importante. Que de fato não é. E por fim, claro que tem pessoas que se mantém firmes nos jogos que acham merecedoras desse título. Nintendista vai dizer que quem leva o GOTY é o The Legend of Zelda: Tears of the Kingdom. Algum fã da Capcom pode torcer para Street Fighter 6 e outro para Resident Evil 4. O pessoal que ainda acredita na Square Enix vai torcer pelo Final Fantasy XVI (a não ser que ainda estejam discutindo se ele é Final Fantasy ou não é).
Só que estou falando aqui mais no sentido coletivo, a impressão geral que os gamers de internet passam. É como se de semanas em semanas a memória deles reiniciassem. Esquecem o último lançamento e saltam para o próximo hype, eventualmente declarando-o como o novo GOTY. E não um novo candidato ao GOTY, mas sim o novo suposto merecedor ao título de GOTY. Com isso o termo acaba se esvaziando.
Vejam bem, quando falo de esvaziamento do termo GOTY não me refiro ao prêmio dado pelo The Game Awards. Pra mim, essas “celebrações” já são vazias por natureza, sendo o The Game Awards nada além do um evento de anúncios e trailers glorificado que intercala com alguns prêmios. E sim, acho essas premiações anuais de “Oscar de sinal trocado” uma bobeira e não pretendo elaborar mais. Quando falo do termo eu estou me referindo a própria noção de um “jogo do ano”, que é um título que hoje não quer dizer nada. Se é que algum dia disse algo!
Aqui eu não estou tentando ser nenhum fiscal de empolgação. As pessoas têm total liberdade para mentirem pra si mesmas que existe essa tal coisa de “jogo do ano” e que ela tem algum valor. Se soou condescendente é porque eu estou sendo condescendente. Simplesmente acho bobo toda a ideia que a gente precisa ter um GOTY. Ainda mais quando os jogos que geralmente entram nessa discussão sempre são os mais mainstream possível, sendo produtos dos estúdios mais consolidados que tem um marketing profissionalíssimo na arte de manipular pelo hype.
E outro esclarecimento: não estou dizendo que jogos do mainstream não merecem toda essa admiração dos gamers. O Baldur’s Gate 3, por exemplo, é um que por tudo que eu vi realmente parece ser um jogo fantástico e que torço que consiga trazer mais pessoas para dentro dos RPGs baseados em turnos. O meu ponto é quando essa comunidade pula de hype em hype todo mês, dizer que “esse jogo é GOTY” vira um elogio vazio.
Parte dessa galera estava falando a mesma coisa de outro jogo no mês anterior e provavelmente falarão de mais um daqui um mês. Toda essa empolgação vai soando mais e mais falsa, parecendo mais fruto do hype do que das qualidades inerentes da obra. Há muito tempo que me parece que o gamer se importa mais no que dizem sobre jogo do que a obra diz por si própria.
…
Ok, ficou confuso. Vou explicar melhor!
Hoje um jogo não precisa ser apenas bom, ele tem que ser validado como bom. Mas também não é somente várias pessoas dizerem que esse jogo é bom. Ironicamente, isso não é bom o bastante. Precisa de algo a mais, precisa de algo que as pessoas possam usar como certificado para dizer como esse jogo é bom mesmo. E mais ainda precisa ter um pronome possessivo da primeira pessoa do singular envolvido porque não é qualquer jogo que precisa ser bom de verdade. O meu jogo favorito tem que ser bom de verdade. Só a minha experiência pessoal não importa, os outros PRECISAM que reconhecê-la como a melhor também.
É aí que entra a alcunha do GOTY, tal como as pessoas fazem com o metascore do Metacritic em todo novo lançamento como um atestado inquestionável da qualidade do jogo. E pior é ver gente discutindo na internet como se houvesse alguma ciência exata envolvida em dar nota pra joguinho. Já cansei de ver postagens perguntando qual “nota” do Metacritic as pessoas achavam que o jogo ia receber. Como se isso fosse: (a) realmente possível de medir; e (b) importasse de verdade. Jogo algum vai ficar melhor porque tem 96 de metascore ou porque está concorrendo no The Game Awards. Achar que premiação ou “nota” define aquilo que faz uma obra de arte relevante é de uma mediocridade galopante.
O que o jogo representa para o seu gênero, quais discussões podemos tirar a partir dele, qual o impacto que aquilo te causou, nada disso vale alguma coisa. Pode valer para um grupo específico de gamers, e infelizmente costuma ser uma galera pedante feito eu, mas para o quadro geral não. Como eu disse, o que o jogo “fala” não tem a menor importância. O que importa de verdade é o que estão falando sobre ele. O importante é ter uma “nota” alta no Metacritic. O importante é ser considerado como GOTY. Porque nada mais pode ser somente um jogo bom que a gente curtiu jogar esse mês, ele precisa ser a experiência universalmente aclamada e reverenciada por todos. Ele não é apenas um jogo, ok? É O JOGO DO ANO!!!
Enfim, nada que eu falei aqui importa de verdade também. Essas são meras reclamações de um cara que tem achado muito ridículo essa mania de se emocionar com o suposto GOTY. Não que as pessoas não devessem se empolgar com as coisas, ano passado eu estava desse mesmo jeito com Monkey Island, só que apenas perdeu o sentido de ter o jogo do ano já que isso acontece todo mês.
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