MC Pipokinha e Monark
Atenção: o texto a seguir contém altas quantias de radioatividade. Proceder com cautela

Ser famoso é uma tarefa complicada de se alcançar. Não é apenas necessário que você tenha algum talento, ou ao menos algo que as pessoas considerem ter valor, como também requer oportunidade. E mesmo assim você ainda está dependente do público. Eu ia falar que depende do aceitamento do público, mas hoje a gente sabe que isso não é verdade. Porque você também consegue ser famoso se for odiado. E se tornar infame é tão mais fácil! Aqui você não precisa de talento, não precisa de carisma, não precisa nem de uma boa ideia. Tudo que você precisa é não ter limites!

Monark é um nome que você vai reconhecer, provavelmente contra a sua vontade. Ele fez fama na internet dez anos atrás com seu canal de YouTube no qual ele postava vídeos sobre Minecraft e se tornou um dos maiores youtubers brasileiros da sua época. A carreira dele entrou em declínio com as mudanças na plataforma e pelo próprio desinteresse do público. Contudo ele conseguiu ter uma “segunda vida” ao criar com seu amigo, Igor 3k, o Flow Podcast que também veio a se tornar um dos maiores podcasts da sua época.

A ideia não era muito original. O próprio Monark e o 3k reconhecem terem copiado o formato do podcast gringo The Joe Rogan Experience. O que permitiu que o Flow se tornasse um fenômeno de visualização foi a filosofia do seu host, o Monark, que nesse intervalo de tempo entre youtuber gamer e podcaster virou uma pessoa mais vocal em relação a política, sobretudo em relação a liberdade de expressão. Monark defende a liberdade de expressão irrestrita e incorporou isso no seu canal. Por isso o Flow recebia todo tipo de pessoa dos mais diferentes nichos. Você tinha desde pessoas vários espectros políticos, artistas, músicos, outros youtubers, jornalistas, cientistas, etc. Tinha até mesmo racistas filhos da puta!

Pela falta de um filtro, tanto o podcast quando seu apresentador colecionaram mais do que dúzias de polêmicas que culminaram no fatídico episódio em que ele defendeu o direito de criação de um partido nazista. Vamos voltar ao Monark depois, porque agora existe uma nova personagem atraindo polêmicas para si na internet: MC Pipokinha.

Outra vez, essa é mais uma pessoa que a existência você conhece contra a sua vontade. A cantora do chamado funk ousadia começou a sua carreira em 2020, conseguindo reconhecimento mais recentemente pelas letras e perfomances no palco que envolvem um alto, ênfase no alto, teor sexual. E assim como Monark, Pipokinha já tem suas controvérsias. Só nas últimas semanas me veem a cabeça: suas falas num podcast que reproduziam um pensamento machista, um vídeo debochando de professores e, por fim, um trecho de um dos seus shows no qual ela recebe sexo oral de uma fã no palco.

Há também toda questão que tem-se criticado a MC Pipokinha pelo fato dela se codificar como uma criança em contextos explicitamente sexuais. O próprio nome escolhido pela cantora já traz essa ideia mais infantil. Isso só piorou recentemente quando reviveram alguns vídeos dela que foram postados em plataformas de conteúdo adulto.

Além de colecionar polêmicas, MC Pipokinha divide uma característica em comum com o Monark em que ambos parecem ser mais seguidos e comentados por pessoas que na verdade as odeiam. E é óbvio que os dois cientes disso e, suspeito eu, que é exatamente aquilo que eles querem. Ninguém se mete em tanta polêmica assim sem querer, existe uma intencionalidade por trás dessas controvérsias nas quais essas figuras se submetem. Vem daquele velho bordão do “falem bem, falem mal, mas falem de mim”. E isso vai de encontro a um fenômeno do mundo do entretenimento, que hoje precisa lidar com uma produção massiva de conteúdo, que eu chamo de “corrida do ultraje. Com o detalhe que, e admito que existe um viés pessoal meu aqui, todos os competidores são pessoas absurdamente medíocres!

Antes de seguirmos, deixa eu definir melhor o que é essa corrida do ultraje. A produção de conteúdo cultural e de entretenimento aumentou exponencialmente nas últimas décadas, ainda mais com a chegada da internet. Se por um lado isso permitiu que mais artistas alcançassem novos públicos, isso também dificultou que mais pessoas pudessem alcançar um local de destaque. Tem muita gente produzindo conteúdo hoje, a competição está cada vez mais acirrada. Por isso que na escalada da fama, e aqui eu me refiro a uma fama que se estender por um prazo mais longo e não aquela temporária por conta de algum vídeo que viralizou na internet, muitos escolhem o caminho da infâmia. Tais pessoas se mantém no centro das atenções não porque tem algum talento, mas porque estão dispostas a se expor em escândalos cada vez maiores já que é a única forma que encontraram de serem vistas.

Agora vamos ao Monark de novo!

Monark não é tão burro quando a gente gosta de achar que é. Ele foi esperto suficiente para identificar um potencial no YouTube brasileiro e investir nele. Foi o que acabou virando o dito mesacast e, junto com o 3k, transformou o Flow não apenas num canal como também numa marca e num estilo que foi reproduzido por dezenas de outros criadores de conteúdo. Mas é só isso. É até aí que e o “talento” do Monark vai. Ele nunca foi um apresentador particularmente bom, mais atrapalhava do que instigava qualquer discussão com seus devaneios e na prática ele servia apenas como um bobo da corte. Só que a gente não ria com o Monark, a gente ria DO Monark pela sua estupidez. Existem vários apresentadores muito mais habilidosos que você encontra nesses outros podcasts que pipocaram nos últimos anos, muitos até mesmo dentro do próprio estúdio do Flow.

Até mesmo na causa que o Monark se diz um defensor, a liberdade de expressão, você nota a falta de uma base filosófica mais forte. Não é a toa que a posição que ele adotou foi a de um absolutista da liberdade de expressão porque, acreditem, ela é bem fácil de se defender. Não exige muita argumentação e raciocínio por trás, basta você ficar repetindo um princípio bem simplista de que todo tipo de discurso deveria ser liberado e pronto. Qualquer nuance vai fazer a pessoa entrar em pane. E é claro que isso requer um pouco de burrice e falta de caráter também. Afinal para manter essa posição você vai ter que, em algum momento, defender barbaridades. E por isso tivemos o Monark, ao vivo, falando que nazista deveria poder se organizar num partido político.

Monark não tem qualquer talento para comédia, para filosofia, para a ética, para a ciência política, para nada. Nem para os jogos ele tem mais. Tudo que o Monark consegue fazer é falar disparates cada vez maiores e abrir espaço para outras pessoas falarem suas maluquices sem conseguir traçar qualquer contestação argumentativa minimamente articulada. No máximo o que ele consegue fazer é discordar por discordar. O famoso Só Para Contrariar. Se você pedir para ele se explicar melhor, ele se embola. Não é a toa que o único momento que o Monark consegue se sobressair é quando há um Eduardo Bolsonaro ou um Fernando Holiday na frente dele. Só na face de outros ignorantes que ele aparenta ser menos idiota ou medíocre.

E falando em mediocridade, MC Pipokinha!

Não precisamos usar o pedantismo e a amargura de um Régis Tadeu ou um Lorde Vinheteiro para considerar que a MC Pipokinha não tem um valor artístico muito alto. Ela não é uma cantora excepcional, sendo generosos a gente pode considerá-la mediana. E isso não tem nada a ver com as “músicas de putaria”. Artistas exploram a sexualidade há anos, seja de forma mais sutil ou então descaradamente. Não existe nenhum problema per se em fazer músicas e shows que tenham esse forte apelo sexual. O problema é que não existe essa escassez no mercado atual!

Serio, balança uma árvore aí que vai cair uma dúzia de cantoras que tem músicas que falam sobre sexo ou incorporam esse apelo sexual nas suas perfomances. Uma Anitta ou uma Luiza Sonza ou então uma das dezenas de cantoras que tenham ou tinham o título de MC como a Mirella ou a Rebecca. É só escolher um nome aí. E todas tem ou mais talento empresarial ou mais talento artístico que a Pipokinha para se manter ou se destacar na indústria. Então, o que ela pode faz para chamar atenção? O mesmo que o Monark quando queria engajamento antes de ter sua conta no Twitter detida: investir no ultraje.

Os shows da MC Pipokinha se tornam cada vez mais explícitos e escrachados unicamente porque é o que ela consegue fazer para ser notada. Há dezenas de outras artistas com o mesmo nível ou maior de talento musical que o dela forma que se ela cantasse uma música comum sobre sexo ela só seria mais do mesmo. Então ela vai até os limites porque é lá onde ela consegue um pouco mais de luz para ser vista.

E claro que funciona. A mulher está há semanas nos assuntos mais comentados do Twitter, assim como o Monark costumava ficar. É impossível impedir que as pessoas se escandalizem com certas falas e atitudes e elas vão querer comentar. E quem entende desse jogo vai se aproveitar dele. Isso nos coloca numa posição ingrata porque se por um lado a gente não deveria dar atenção para quem só está procurando causar pra ganhar atenção, por outro há discursos que não podemos simplesmente ignorar.

Ok, a história da fã fazendo sexo oral podia deixar morrer no esquecimento afinal nota-se o desespero em polemizar para virar notícia. Mas como é que a gente vai ficar quieto quando a MC Pipokinha responsabiliza mais a vítima do que o agressor numa situação de assédio? Da mesma forma que não dava pra ficar calado quando o Monark estava lá defendendo o direito de nazistas se organizarem politicamente. É o tipo de discurso que a gente tem que criticar porque senão só sobra as pessoas que concordam e defendem essas ideias. E elas não vão pensar nem duas vezes antes compartilhá-las a rodo nos seus grupos e bolhas e fazer esse pensamento ganhar mais tração. Achar que esse tipo de discurso vai se extinguir só se a gente não dar atenção pra ele é uma visão muito inocente. E eu diria covarde também!

Isso é a parte escrota da corrida do ultraje, porque não tem muito que fazer. As pessoas vão se escandalizar, vão comentar e a pessoa vai receber engajamento mesmo que seja de forma negativa. Felizmente há um porém porque achar que mc pipokinhas e monarks da vida estão apenas se beneficiando com toda essa atenção é olhar apenas uma parte dessa história e não observar as consequências a médio e longo prazo. Porque outro detalhe da corrida do ultraje é que o prêmio é uma ilusão. A “fama” que você conquista se baseia exclusivamente nas polêmicas coletadas vem cobrar um preço alto no final.

Só olhar para o que aconteceu com o Monark.

Ele ganhou atenção por um longo período de tempo e conseguiu angariar fãs e pessoas que concordam com suas ideias. Porém ele também colheu o que plantou. Monark foi falando idiotices, para dizer o mínimo, cada vez maiores que conseguiu ser expulso do próprio podcast, perdeu acesso a várias plataformas, está queimado para qualquer patrocínio e até mesmo colaboração com outros criadores de conteúdos. Hoje ele precisa recorrer a figuras cada vez mais obscuras da internet pra conseguir ter um convidado para o seu novo programa. Sem contar que o Monark sofre para obter as mesmas visualizações que um mesacast dos mais chinfrins consegue no YouTube, até mesmo com a saturação do mercado para esse tipo de conteúdo.

O que vocês acham que tende a acontecer com a MC Pipokinha? Já tem evento cancelando a participação dela por conta das recentes polêmicas. Quanto mais ela tentar ganhar engajamento e infâmia pelo ultraje, maior risco ela se torna para festivais e outros empreendimentos. Publicidade negativa ainda é publicidade, mas ainda existem consequências para sua carreira. Para que se arriscar chamar a Pipokinha para um show se você pode encontrar com facilidade uma cantora do mesmo nível dela e com muito menos polêmicas nas costas?

Por enquanto ela ainda consegue fechar contratos. Mas até quando isso vai durar? Desse jeito no futuro só haverá duas saídas para a MC Pipokinha: virar evangélica e tentar carreira no gospel ou então virar co-host no Monark Talks.

Deixo a cargo de vocês decidir qual é o destino mais terrível!


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2 thoughts on “Monark, MC Pipokinha e a corrida do ultraje”
  1. O penúltimo parágrafo desse post foi uma das coisas mais assustadores que eu já li nesses últimos anos, vc devia mandar pra A24 transformar em filme de terror.

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