Inkey University e a comédia não-intencional no eroge


Inkey University é um eroge, portanto o texto conterá algumas imagens com nudez. Se você é uma mãe super protetora ou um jovem que não conseguiu aguentar nem aquela cena de Oppenheimer, por favor, pare por aqui para não vir me encher o saco depois.


Imagem edita do jogo de RPG Maker, Inkey University, mostrando o desenho de uma aluna inclinada procurando livros numa caixa e na frente da sua bunda foi colocado o meme de um gato rindo com um emoji apontando para frente
Meu Deus! Eu perdi mesmo o controle da minha vida

Recomendar qualquer coisa para mim, ainda mais jogos, é igual rolar um dado de 100 lados. O que isso significa? Que eu posso começar a jogar o que você me sugeriu tanto naquele mesmo dia quanto no seguinte, daqui duas semanas, seis meses ou até mesmo cinco ou mais anos. Não é nada pessoal, é só como a minha mente funciona. Existe uma enorme pilha de jogos na minha caixinha mental de recomendações e ela aumenta todo dia. Às vezes eu jogo algo que está no topo, às vezes na base, às vezes enfio a mão dentro da pilha e vejo o que tem lá.

Fiz toda essa analogia só para dizer que depois de uma década eu finalmente joguei Inkey University!

Como eu costumo falar bastante de RPG Maker aqui no blog, eu já devo ter mencionado como uma das tradições mais antigas quanto a própria engine é o pessoal usá-la para fazer jogos que não são RPGs. Algo que acontece tanto na gringa quanto nas comunidades brasileiras. Por exemplo, temos Vila do Nevoeiro, um survival horror com fortes inspirações em Silent Hill, e 1-bit Explorer, um jogo de ação-aventura monocromático com umas pitadas de terror lovecraftiano. Curioso a forte presença de elementos de terror no RPG Maker, mas isso é papo para outro dia. Temos também o supracitado Inkey University que foi uma visual novel feita pelo Uhtred com o qual convivi nos meus tempos de Centro RPG Maker.

Visual novels são um mercado bem consolidado na indústria de produção multimídia do Japão. Animês como Fate/stay night, Steins;Gate e Clannad tiveram suas origens nas visual novels. E isso foi só um dos poucos exemplos que meu conhecimento limitado me permite citar. Por isso que aqui no Brasil esses jogos são mais consumidos pelo nicho otaku. Pensando nisso, faz bastante sentido que as visual novels marcariam presença também no RPG Maker, pois é uma comunidade que também se intersecciona com a dos otakus. Basta ver a quantidade de fangames de animês que existem nesse micro universo maker.

Passeando pela Itch.io eu encontrei alguns exemplos de visual novels criadas no RPG Maker como End Date e Auld Lang Syne: Cat and Mouse. Exemplos brasileiros infelizmente eu não sei de nenhum além de Inkey University, mas é fácil imaginar o porquê. Não apenas porque é um nicho ainda bem pequeno, mas porque também são jogos que exigem uma edição pesada de imagens e muito trabalho de programar os eventos numa engine que não foi pensada para esse tipo de gameplay. Se eu não me engano, o Uhtred era designer gráfico então para ele deve ter sido bem mais fácil conseguir recursos para o seu jogo. Mas chega de divagações e vamos para Inkey University.

UM BREVE RESUMO DE INKEY UNIVERSITY

Pois bem, como o nome indica, o jogo se desenvolve em torno de uma universidade durante o primeiro ano do calouro Yasuji. Inkey University vai por uma linha de slice of life, mostrando os percalços do protagonista em se acostumar ao dia-a-dia de uma universidade com pequenas linhas narrativas se dividindo entre os alunos, professores e funcionários que ele encontra. Dentre esses personagens se destacam cinco garotas que são os interesses amorosos do Yasuji: Miyuki, Reiko, Sayuri, Harumi e Akane. Porém, em paralelo a vida de estudante, o jogo também tem uma segunda trama de mistério sobrenatural. Yasuji é assombrado por pesadelos recorrentes que estão conectados a uma série de assassinatos que aconteceu na universidade muitos anos atrás.

Vou me limitar à sinopse porque eu não pretendo aprofundar na história de Inkey University por aqui. Tanto é que resolvi abordá-lo com um artigo e não com uma crítica. Eu tive pouquíssimo contato com visual novels e por pouquíssimo contato eu quero dizer que as únicas que joguei foram Doki Doki Literature Club e The Murder of Sonic the Hedgehog. Logo, apenas com esse recorte eu não me sinto apto a analisar Inkey University segundo o seu formato. Ele me parece uma visual novel bem convencional, mas isso é com base no que eu já ouvi sobre esse gênero e não com base do que eu mesmo vi, logo não posso sair afirmando coisas com muita confiança.

Imagens de Inkey University, visual novel feita no RPG Maker pelo Uhtred

Mas para situá-los um pouco mais da “jogabilidade” de Inkey University caso tenham interesse em jogá-lo, dá para fazer alguns comentários. O jogo tem uma narrativa bem linear. Ainda que existam várias opções de namoro, ele não segue bem a lógica de um date sim. A passagem de tempo é scriptada, então você não precisa administrar tempo e sim nas escolhas corretas para conquistar uma das cinco personagens possíveis.

Essas escolhas dividem a história em pseudo-ramos narrativos, ou seja, ainda que elas levem a cenas diferentes, todas elas vão convergir para o mesmo ponto. Por exemplo, em determinado momento você tem a chance de seguir um personagem ou voltar para o seu dormitório. Nenhuma das “rotas” vai ter impacto na trama, porque o verdadeiro final do jogo é determinado por pontos específicos: passar nas provas no final do ano, conquistar uma das possíveis pretendentes e digitar o nome correto ao interagir com um novo personagem que aparece no final de Inkey University. As escolhas que têm um real impacto são aquelas que levam a melhorar sua pontuação com um dos seus cinco interesses amorosos.

Por isso que eu acho que Inkey University funciona bem melhor no seu lado visual do que do seu lado novel. A parte mais interessante pra mim foi ver como o Uhtred conseguiu transmitir (o que eu considero) uma experiência bem fiel a uma visual novel feita numa ferramenta apropriada. Alguns personagens parecem ser de diferentes estilos, mas eu sempre achei a falta de uma “homogeneidade estética” uma qualidade da cultura do RPG Maker. Já em termos de história não teve muito que dar para tirar do jogo. O mistério é pouco desenvolvido, os personagens não convencem como universitários e senti que faltou algum tema forte que amarrasse a trama.

Mas também o grande problema de Inkey University, para mim, é o fato dele ser um eroge!

NÃO MUITO ERÓTICO, MAS MUITO ENGRAÇADO

Ok, vamos com calma!

Num tempo em que se iniciou uma nova cruzada contra jogos adultos e que jovens (e alguns não tão jovens) ficam na internet reclamando como “a cena de sexo não avançou o plot”, tem que tomar cuidado com algumas afirmações para não ser mal interpretado. É quase como se eu fizesse intencionalmente para gerar uma reação. O que eu quis dizer na verdade é que os elementos eróticos de Inkey University acabam gerando momentos de comédia não-intencional que continuamente quebram o tom do jogo para mim.

Eu estava plenamente ciente que haveria cenas de sexo explícito no jogo já que o Uhtred o divulga como uma hentai visual novel. Ou seja, um eroge. Vale destacar que eroge não é exatamente um subgênero das visual novels porque ele nem mesmo está preso a esse estilo de jogo. O termo serve para categorizar qualquer jogo que possua algum conteúdo sexual explícito, ainda que a história não gire em torno desse aspecto.

Então, por conta de eu saber bem pouco sobre esses jogos, eu supus que esses elementos apareceriam mais para o fim de Inkey University como uma espécie de “recompensa” ao concluir uma das cinco rotas de namoro. Contudo, para minha surpresa, estava lá o Yasuji passeando todo pimpão pelo bosque da universidade quando ele ouve um barulho, vai investigar e isso acontece:

A minha primeira reação foi dar uma gargalhada. A cena em si não é engraçada, ainda que depois ela tente se tratar como comédia por como o Yasuji reage ao encontrar a segurança da universidade se masturbando. O que causou meu riso foi por aquilo parecer uma sequência extraída diretamente de um hentai.

Vale destacar que essa é a primeira cena com conteúdo explícito que acontece depois de um longo período em Inkey University. Até então o mais próximo que o jogo chegou são dois momentos em que ele arranja um jeito de botar um ângulo em que o protagonista acaba vendo a cacinha da Miyuki e da Reiko. Ainda que exista uma qualidade erótica nisso, é uma cena que eu já vi em tantos shonenzão que se desenvolvem dentro ou fora do ambiente escolar que eu já fiquei anestesiado dela. Hoje pra mim é só uma piadinha boba para adolescentes com a puberdade estalando.

Eu não defendo que uma cena de sexo precisa de alguma justificava para se encaixar dentro de uma narrativa. “Não avançar o plot” é papo para quem tem um nível de crítica sobre mídias bem baixo. Mas é sim um momento gratuito que parece estar ali só para tentar “apimentar” o jogo depois de algumas horas de melodrama universitário. A personagem em questão é a Yume, uma das seguranças do campus, e uma das três personagens que Yasuji pode ter uma relação sexual além dos seus interesses amorosos. As outras duas são a enfermeira Naomi e a professora Kaoru, cujas cenas têm uma construção menos abrupta do que a da Yume.

A partir desse ponto, Inkey University iniciou um padrão de tempos em tempos introduzir alguma cena com teor mais sexual ou erótico em que quase sempre a minha reação era a de dar risada. A imagem que abre o texto, por exemplo, não é de nenhuma das personagens citadas. Na verdade, a moça nem mesmo tem um nome. Esse momento acontece no segundo capítulo do jogo em que o Yasuji precisa decidir em que clube da universidade irá se inscrever. Como na minha primeira jogatina eu decidi seguir a rota da Reiko, eu escolhi o clube de pesquisa.

No seu primeiro dia, Yasuji vai para biblioteca para conversar com o responsável pela administração do clube e tem que responder três perguntinhas simples. Um pouco depois disso, o Yasuji se vira do nada e diz “olha aquela garota está tentando pegar algum livro” e toma-lhe um rabão surpresa na tela. Novamente, minha reação foi dar outra risada. Cada clube tem uma sequência parecida. No de tênis, por exemplo, o protagonista está olhando para uma aluna jogando uma partida e aí rola mais um dos manjados ângulos em que a calcinha dela aparece. Mas foi o caso do clube de pesquisa que me fez dar uma risada de tão forçado que foi só para mostrar uma raba.

Já o caso da enfermeira Naomi é um pouco diferente porque ela tem duas cenas de sexo explícito com o Yasuji que acontecem em momentos distintos de Inkey University. Eu não vou falar da primeira porque é uma cena de estupro de vulnerável que o jogo não considera como tal porque a vítima é um homem e a abusadora é convencionalmente atraente. Certo, então vamos para a segunda que acontece em meio a semana de provas. A Naomi encontra o Yasuji e ele fala como está se sentindo muito cansado esses dias. Ela então o convida para ir no consultório para tomar um remédio que o fará melhorar. O que será que acontece em seguida? Vejamos:

Apesar de não ter nenhuma surpresa já que era óbvio qual seria o desfecho daquela sequência, eu ainda dei uma risada graças ao diálogo. “Não existe remédio melhor do que esse!”, puta que pariu! Depois disso só nos resta o caso da Kaoru. Na verdade existe mais uma chance de se obter uma cena de sexo com a Yume, porém o primeiro exemplo já serviu para o propósito do texto.

Kaoru é uma das personagens que temos menos interações ao longo do jogo. Numa delas você a encontra no bosque – sempre aquele bosque – e pode escolher a opção de observar a lua com ela. Se você fizer isso e mais a frente tirar 10 na prova de psicologia, ela vem te abordar para parabenizá-lo e dizer que tem uma “recompensa” para te dar. Assim vocês vão para uma conveniente sala escondida dos professores que convenientemente tem uma cama. Eu não cheguei a gargalhar por como nas outras ocasiões porque já estava repetitivo, porém soltei um arzinho pelo nariz por conta de todo o ridículo da situação só para levar a mais uma cena de sexo.

Reforço que eu não estou criticando o jogo pela forma gratuita com que traz esses momentos para dentro da sua história. Inkey University é honesto com aquilo que te propões. O que eu estou pontuando é como em momento algum o jogo conseguiu ter um apelo erótico comigo e só conseguiu surtir um efeito cômico comigo. Não acho que seja um problema específico de Inkey University, acho que é um problema de formato mesmo.

A SEX COMEDY NÃO-INTENCIONAL NOS VÍDEO GAMES

Já deve ter uns dois anos ou mais que eu joguei House Party. Não lembro exatamente como esse jogo chegou até mim, porém isso não é tão importante. House Party é um jogo de aventura 3D inspirado em sex comedies como Porky’s, O Último Virgem Americano e American Pie. Toda história se passa numa festa para qual o protagonista, podendo ser um homem ou uma mulher, é convidado por um dos seus amigos. O objetivo é interagir com os outros convidados, conversando e realizando alguns favores para melhorar sua relação com cada um. Dependendo do seu desempenho, você consegue transar com eles. Não todos, porque algumas escolhas irão bloquear certas rotas.

Diferente de Inkey University, em House Party as cenas de sexo não se limitam a imagens estáticas com um texto passando por cima. Todas tem animações e você pode escolher algumas posições que variam de personagem para personagem. Entretanto o jogo surtiu o mesmo efeito comigo que é o de me fazer rir nas suas interações sexuais. Não é exagero que em momento algum eu me senti minimamente excitado, seja em House Party ou seja em Inkey University, mesmo com tantas cenas de sexo. Acredito que é porque apesar do conteúdo ser explícito, ele é pouquíssimo sensual.

Cena de sexo na banheira no jogo House Party

O erotismo na arte visa mexer com nossos sentimentos através da exploração da sensualidade e dos nossos desejos. Ele não precisa nem mesmo ser explícito para conseguir efeito, pois sua preocupação é muito menos sexual e muito mais estética. É por isso que você consegue se sentir muito mais excitado lendo um conto do que vendo uma cena de sexo real, pois é muito mais sugestivo e utiliza sua própria percepção para aflorar essas sensações.

Não é porque são personagens 2D ou 3D que não existe existe essa excitação, na prática eles são tão reais quanto os atores de um filme pornográfico. O problema é que o jogo não consegue brincar com a sua imaginação ao tornar tudo tão explícito e ainda se arrisca a surtir um efeito mais cômico do que excitante. Relembrando aqui de House Party, as expressões dos modelos e os efeitos sonoros de gemidos repetitivos deixavam a cena mais com um humor constrangedor aos moldes de The Office do que qualquer outra coisa para mim.

O mesmo se aplica à Inkey University, porque em boa parte das cenas eu me sentia lendo mensagens de sexting de alguma pessoa. Não dá para você ler o personagem gritando “Eu vou gozaaaaaaar!” e manter a compostura. Fica engraçado, engraçado pra… cacete! Lembram quando dublaram o hentai Overflow e viralizou a esposa de um dos dubladores reagiu a um dos diálogos? É assim que eu ficava durante esses momentos em Inkey University. Eu não consigo manter uma expressão séria vendo personagens falando coisas como:

Sora, personagem de Inkey University, transando com o protagonista do jogo
*laughs in Bola*

Talvez dado o contexto essa não seria
a risada mais apropriada do Bola,
entretanto é a minha favorita!

Para… finalizar, eu recomendo Inkey University como eu recomendo qualquer jogo de RPG Maker que tenta fazer algo diferente de um RPG. Não é uma história muito memorável, mas dá para reconhecer o esforço do Uhtred em nos trazer uma experiência bem próxima de uma visual novel comum. E, mesmo que não-intencionalmente, é uma comédia da hora!


Backlogger precisa do seu apoio para crescer. Então, por favor, compartilhe ou deixe um comentário que isso ajuda imensamente o blog. Para mais textos do Game Cuts clique aqui.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima