
Os beat’em ups entraram um pouco tarde na minha vida. Como toda criança em posse de um Mega Drive, eu joguei bastante alguns clássicos como Streets of Rage (que adoro) e Golden Axe (que existe). Também tive a chance de (tentar) zerar The King of Dragons com um amigo no Super Nintendo e, se não for um caso de falsa memória, me aventurei um pouco em Fighting Force no PlayStation. Contudo, pela maior parte do tempo eu apenas observei o gênero de longe conhecendo alguns títulos mais pelo nome do que pela experiência de jogá-los. Isso foi mudar apenas quando eu fiquei mais velho e passei a ter interesse pelos beat’em ups por achá-los uma ótima expressão do conceito de curva de aprendizagem.
Assim eu conheci o meu amigo Savino lá do canal do The Flying Kick – que já virou uma piada interna aqui do blog de tanto que eu o cito sempre que vou falar de outro beat’em up – e também foi assim que eu cheguei a Fight’N Rage, jogo desenvolvido pelo uruguaio Sebastián García. Eu zerei Fight’N Rage uns dois anos mais ou menos antes de criar Backlogger e por isso não cheguei a lhe dedicar um texto. Mas teve uma menção naquele artigo em que falo sobre narrativa como uma qualidade diferencial.
Pois bem, devido alguns eventos recentes eu acabei instalando-o novamente e não podia deixar a oportunidade de falar dele por aqui. Quando escrevi sobre Wulverblade eu fiz questão de pontuar que ele é o melhor beat’em up que sei que vocês NÃO jogaram. Isso porque considero que cabe a Fight’N Rage o título de melhor beat’em up que TALVEZ vocês jogaram. Ele provavelmente é um dos jogos que não está associado a uma propriedade intelectual famosa com mais chance de ser conhecido por quem está fora desse nicho. Entretanto ainda acho que não recebe todo o reconhecimento que merece. Se tratando da boa e velha “briga de rua” (com mutantes), esse é um dos maiores beat’em ups que tivemos na última década.
Falar que algo é uma “carta de amor” a determinados jogos, ainda mais nesse contexto indie, é um tremendo clichê. Ao mesmo tempo, não existe uma forma mais exata de descrever o Fight’N Rage porque até mesmo o nome dele deixa claro suas referências. Mas isso não se limita apenas aos beat’em ups, o Sebastián García puxa tudo que pode desse macrouniverso da luta, sejam jogos, filmes, atores, desenhos, etc.

Os protagonistas escancaram isso sem qualquer cerimônia. Ricardo é a versão minotauresca do Haggar de Final Fight, Gal é inspirada na Mina Majikina de Samurai Showdown e F. Norris é uma espécie de Chuck Norris misturado com os ninjas do Clã do Pé de Tartaruga Ninjas. O mesmo se estende para os inimigos, pois não tem um personagem sequer que não dê para conectar a algum nome conhecido. Até mesmo na sua apresentação visual Fight’N Rage acaba sendo uma referência. Ele tem esse filtro que simula os antigos monitores CRT dos fliperamas e das TV, inclusive com aquelas bordas curvadas.
Então é óbvio que existe muita nostalgia envolvida em Fight’N Rage, ele é uma amálgama de cultura pop de porradaria dos anos 80 e 90. Mas não é como se o jogo se apoiasse somente nisso para ter algum apelo com o público, a jogabildade também é uma maravilha. O Sebastián García não pensou Fight’N Rage exclusivamente pela dinâmica de um beat’em up e aplica uma lógica de jogo de luta. Cada personagem tem uma quantidade limitada de golpes, porém as combinações que você pode fazer parecem infinitas. Convido a qualquer um a testar o modo de treinamento antes de começar uma campanha só para ver o quanto de combos o jogo te permite fazer se você tiver habilidade o suficiente.
Claro que ali no calor da briga você não vai conseguir realizar todas essas possibilidades, a maioria dos inimigos não vai nem aguentar um combo completo. Porém mesmo que você não esteja tentando fazer um, você sente com naturalidade como cada ataque se conecta com o outro. É um dos combates mais divertidos que eu já experimentei nesses anos em que mergulhei nos beat’em ups e cada vez me sinto mais seguro de dizer que é o melhor.
Mas algo que me surpreendeu foi o lado narrativo de Fight’N Rage. A história é simples: depois de um desastre que dizima a maior parte da população, o que sobrou da humanidade agora é escravizada por uma raça de mutantes e os protagonistas resolvem pôr um fim nisso. A campanha é linear como todo beat’em up, porém existem diferentes rotas que dependem das bifurcações e escolhas que você toma entre as fases. O começo ilustra isso muito bem porque já no início da fase você pode decidir em fugir da fábrica pela esquerda ou seguir em frente pela direita. No final você encontra o chefão usando uma garota de refém e ameaçando matá-la se seu personagem se aproximar. Caso você esteja segurando uma arma, você pode jogá-la no chefão. Salvando a vítima você abre uma rota alternativa pelos esgotos que vai te levar para uma vila secreta.

Isso dá um valor de replay bem maior para Fight’N Rage porque cada caminho vai levar a um detalhe novo do seu universo, com fases, personagens e diálogos diferentes que culminam em um dos 56 finais possíveis. Ninguém é desocupado louco de concluir cada um deles, até porque as variações não são tão grandes. Você sempre vai terminar no mesmo lugar, lutando contra o mesmo chefão. Porém cria uma sensação mínima de novidade para mitigar essa repetição natural de um beat’em up. As fases também são curtas o bastante para não deixar o jogo enjoativo e te incentivar a começar uma nova campanha e ir por um novo caminho.
Eu não vejo motivos para estender esse texto porque já cobri tudo demais relevante em Fight’N Rage. É um jogo excelente que mostra como o gênero está tão vivo quanto nunca se você souber onde procurar. Uma pena que depois de todos esses anos o Sebastián García não deu sinal que pretende fazer uma sequência, porque o potencial existe ali. Então fica aqui meu apelo por um Fight’N Rage 2. Faça pelo Ricardo!!!
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