Canais de opinião são uma das grandes pragas do YouTube!
Essa não é nenhuma… opinião remotamente impopular, polêmica ou controversa. Pelo contrário, provável que esse seja o o maior senso comum da última década da plataforma. Talvez se eu citasse o conteúdo de um youtuber em específico isso me geraria algum problema. Porém, falar mal em aspectos gerais de toda a dita comunidade de canais de opinião é uma das coisas mais seguras de se fazer. De uns anos para cá, esses canais angariaram uma infâmia que poucos tipos de conteúdo conseguem superar e isso num mundo em que ainda existem youtubers de pegadinha.
Farei uma retrospectiva agora e espero que eu consiga ser breve. Assim como muitas das tendências do YouTube brasileiro, o formato de vídeo de opinião – ou vídeo de comentário – veio da gringa. Inclusive ‘comunidade de comentário’ é um termo que vem de lá também. Aqui no Brasil eu não sei dizer quem foi o primeiro youtuber a fazer esses vídeos, mas quem os popularizou foi o Goularte. Inicialmente ele gravava vídeos de Minecraft, tal como muitos youtubers da segunda metade dos anos 2010, mas resolveu mudar o formato do seu conteúdo. Ele usava um estilo que acho que podemos chamar de “clássico” dessa comunidade de comentário que era a narração de um assunto do momento com uma gameplay de fundo.
O Goularte acabou inspirando novos canais que replicavam esse mesmo formato. Inclusive a história dos canais de opinião sempre foi marcada com tretas desde a sua gênese, pois logo no início eles eram chamados de cópias do Goularte. Sendo honesto, muitos deles eram mesmo. De qualquer forma, com o tempo alguns canais foram desenvolvendo um estilo próprio – que também passou a ser replicado por outros membros dessa comunidade – e assim surgiram nomes como como Tio Sun, PerSiMa, Suavemente Comentado, Utopia e, aquele que viria se tornar o maior de todos, Diggo.
Esses são apenas alguns dos nomes que eu lembro por serem mais conhecidos que a média e que não foram acusados de pedofilia . Eram dezenas e mais dezenas de youtubers ingressando nessa comunidade, alguns que hoje mudaram o tipo de conteúdo que produzem, como a Jay Mello, ou simplesmente desistiram da carreira de youtuber. Fiquei com preguiça de buscar um exemplo. Enfim, um dos fatores que, para mim, afastaram algumas pessoas dessa comunidade de canal de opinião foi que embora se mostrasse um conteúdo relativamente popular, ele também foi se mostrando bem IMpopular. Críticas surgiram em relação à comunidade e se acumularam com o tempo. Contudo não eram exatamente os indivíduos que eram criticados – em alguns casos sim – mas a própria forma dos canais de opinião como um todo.
Clickbaits, falta de sensibilidade com os assuntos tratados, sensacionalismo, vídeos sem roteiro, pouca ou nenhuma pesquisa antes de gravar, etc. Defeitos é o que não faltava para se apontar e eu nem entrei nas polêmicas mais graves. Essa visão negativa dos canais de opinião só se reforçou ao longo dos anos seguintes. Por isso, hoje, eles são vistos como nada além de abutres que aguardam a próxima tragédia ou treta para poderem fazer um vídeo rápido e pegar o máximo de visualização do momento.
Vamos pensar um pouco mais nessa última frase. Antes de existirem os canais de opinião surgiu no YouTube brasileiro o Treta News. O canal postava uma série de vídeos curtos que cobriam alguma polêmica recente envolvendo figuras da internet. O valor de produção não era muito alto, pois o youtuber apenas usava o FaceRig para mapear seu rosto e colocar um personagem antropomorfizado no seu lugar e distorcia sua voz. Depois ele lia um resumão de uma ou duas tretas e pronto. Hoje o canal ainda está de pé, fazendo vídeos um pouco mais longos – e com propaganda da Blaze – com o mesmo valor de produção e com menos visualizações do que antigamente.
O conteúdo do Treta News apesar de popular, nunca foi muito elogiado. Acho até mesmo quem consumia estava ciente que eram vídeos fracos que se sustentavam apenas porque todo mundo gosta de fofoca, embora nem todos admitam. Olhando em retrospecto, pelo menos tinha uma “””qualidade””” no Treta News que não dá para dizer dos canais de opinião que vieram no futuro. Ele ao menos era honesto com a sua audiência sobre a natureza do seu conteúdo. O canal nunca se portou como nada além de um canal que cobre fofocas da internet.
Por outro lado, quando os canais de opinião chegaram eles tinham aquele verniz de querer mostrar a sua visão sobre um determinado assunto. Mesmo que muitos deles só faziam uma descrição com mais detalhes e uma edição um pouco melhor que o Treta News com base no que estavam comentando nas redes sociais. Alguns vídeos nem mesmo continham uma opinião.
Se eu não estou enganado, o auge dos canais de opinião foi ali por 2021 antes que a percepção negativa e as polêmicas de dentro da própria comunidade aumentou bastante. Assim como a epidemia de mesacasts que tivemos pós-Flow, somente os nomes maiores conseguiram se sustentar na plataforma. Mas não significa que a comunidade de opinião morreu de fato. O Diggo segue aí com um canal bem sucedido e existem outros youtubers que ainda tentam emplacar com esse tipo de conteúdo. Durante o caso Raluca vimos dúzias desses canais pipocarem usando e abusando do algoritmo para conseguir visualização. Porém a opinião pública sobre eles não melhorou desde aqueles tempos imemoriais e eventos recentes mostram que isso não vai mudar. Nem a mentalidade dos canais de opinião e nem a recepção do seus críticos.
Na noite de 13 de fevereiro de 2024 o Cellbit, um dos maiores streamers brasileiros da atualidade, soltou o agora famoso PDF de 19 páginas. Nesse documento ele quebra o seu silêncio de sete anos desde seu término com a streamer Sasa que é uma polêmica antiga deles. Entre 2017 e 2018 a Sasa expôs o fim do seu relacionamento alegando que durante o tempo que estiveram juntos o Cellbit se mostrou um namorado tóxico. Teriam ocorrido várias brigas e manipulações por parte dele que deixaram a Sasa muito abalada. Até então pensava-se que o Cellbit teria assumido a culpa pelos seus erros, tanto que falam que depois do término ele buscou fazer terapia para melhorar como pessoa.
Porém a percepção sobre o término mudou com a divulgação do tal PDF de 19 páginas. Na semana anterior a publicação, a Sasa teria feito um tweet – que convenientemente foi apagado minutos depois – onde ela não só relembrava a história do relacionamento tóxico como acusava o Cellbit de tê-la agredido sexualmente. Cansado de aguentar as acusações todo esses anos, ele enfim resolveu dar o seu lado da história. Pois bem, eu não vou falar mais sobre esse caso porque ele traz diversas questões delicadas que não cabem nesse texto e nem competem a mim falar sobre. Mas a ainda existente comunidade de canais de opinião não pensa dessa forma, não é mesmo?
O documento, como eu disse, foi postado de noite ali às 10:30 mais ou menos. Eu fui ficar sabendo dele só na manhã seguinte ao olhar os assuntos mais comentados do Twitter e estranhar que um dos tópicos era ‘PDF de 19’. Assim que terminei de ler o documento eu resolvi fazer um teste e fui direto para YouTube. Coloquei “cellbit” e voilá, depois de alguns cortes do canal dele começaram a aparecer alguns vídeos de canais de opinião já comentando sobre o caso. Não tinha passado nem mesmo 12 horas desde que o documento tinha ido ao ar. Ao longo do dia apareceram vários outros e aqui eu listo aqueles que valem a pena conferir:
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Pode parecer que estou sendo exageradamente cínico, mas de verdade não tem um desses vídeos que valha o tempo de qualquer um. Você não vai tirar nada deles que não conseguiria lendo o PDF original. A falta de qualidade só não é maior do que o descaso com a situação. Qualidade é resultado de uma gama de diferentes fatores. Mas um deles que eu acredito ser determinístico é o tempo. Independente do seu nível de habilidade, um vídeo que você produz após uma semana será melhor do que aquele que você fazer em 24 horas.
Por isso eu acho meus textos mais longos, como ‘As campanhas de Treasure of the Rudras‘, ‘Thimbleweed Park: buscando significado no absurdo‘ e ‘O legado de Sweet Home‘, são muito melhores do que aqueles que publico no BO da Semana ou nas Rapidinhas. Não é nem por conta do tamanho e sim porque esses últimos eu faço no espaço de um dia, às vezes até menos. Os demais eu passo um tempo muito maior pesquisando sobre, organizando meus pensamentos, refletindo e escrevendo. De vez em quando até sai algo que eu acho que ficou surpreendentemente bom apesar da rapidez, mas no geral eu reconheço que a pressa em publicar afeta muito a qualidade.
Agora no que tange os canais de opinião, eu não acho que o que afeta os vídeos é gana de ser o primeiro a comentar. O que me incomoda, e pelo que pude ver incomoda muitas outras pessoas também, é a evidente falta de interesse em cobrir o tópico para além das visualizações que ele vai gerar. Não existe uma reflexão sincera que o “youtuber de opinião” quer causar no seu público, é só cobrir a fofoca que eles sabem que o povo vai querer ouvir. Por isso é tudo feito às pressas sem qualquer compromisso com qualidade ou real empatia com os envolvidos. Tem que aproveitar a notícia enquanto ela está quente, até mesmo quando é um assunto delicado que exige mais tato.
Por melhor pessoa que você seja, não tem como você produzir um vídeo com menos de dez horas do ocorrido e dizer de cara limpa que o fez com alguma boa intenção. Você só quer o clique, a visualização. Tanto que também não me surpreende que hoje está saindo toda uma nova leva de vídeos cobrindo o pronunciamento que a Sasa deu ontem. Novamente, a gente viu esse mesmo processo acontecendo ano passado com o caso Raluca. Qualquer informação nova sobre a treta dele, do Yanni e do Jean L, por menor que fosse, virava pauta pra um vídeo todo a respeito. E quanto não se falava dos envolvidos, falava-se de alguém que fez um vídeo sobre os envolvidos. Até mesmo quando questões sensíveis como suicídio e abuso surgiram nessa treta o pessoal tratava apenas como nova pauta para um novo vídeo.
Como eu queria que o problema dos canais de opinião fosse apenas a futilidade do conteúdo. Que aliás eu não condeno. Não escondo de ninguém que gosto de uma boa fofoca. Só é foda ver que depois de três anos esses abutres continuam agindo da mesma forma. Mudam-se os estilos de thumb, porém a falta de sensibilidade permanece tão grande quanto a falta de qualidade.
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