Ah, eu estava com saudades de reclamar aqui! Ontem, durante a Xbox Developer Direct, a Microsoft anunciou o novo jogo do mais icônico arqueólogo do cinema: Indiana Jones and the Great Circle. Essa vai ser uma produção da MachineGames, estúdio especialista em jogos FPS e conhecido pelos mais recentes títulos da franquia Wolfenstein. O trailer deixou a comunidade gamer em polvorosa. E agora estamos todos aqui ansiosos pelo lançamento do jogo e esperançosos que ele traga uma nova leva de títulos de India Jones para os consoles.
Certo?
É ÓBVIO QUE NÃO!
O pessoal ESTÁ em polvorosa, mas, como de costume, é por um motivo besta. Eu costumo dizer que “não existe uma única discussão real sequer na comunidade gamer” e sigo acreditando na minha afirmação. Porque o principal motivo de estarem falando sobre Indiana Jones and the Great Circle é pelo fato de se tratar de um jogo com perspectiva em primeira pessoa. Contudo uma parcela dos gamers gostaria que ele fosse em terceira pessoa e agora estamos nesse pingue-pongue de qual deveria ser a câmera ideal para um novo joguinho de Indiana Jones. Afinal isso é uma ciência exata e não pura subjetividade, né?
Se fosse apenas uma questão de gosto pessoal eu não teria motivos para me meter nessa “discussão”. Apesar de evidências do contrário, eu não gosto de roguelikes e já torço o nariz para qualquer menção desse conjunto de mecânicas quando anunciam algum título do gênero. Só que eu não fico nas minhas redes sociais falando como eu acho que deveriam fazer o jogo, simplesmente risco da minha lista de interesse e sigo com a minha vida.
Só que não foi bem essa atitude que eu venho observando na internet. Quisera eu que fosse um caso isolado, mas há precedentes. As falas sobre como seria melhor que Indiana Jones and the Great Circle fosse em terceira pessoa vinham com o complemento de “igual Uncharted e Tomb Raider”. Isso que me pegou! É nessa hora que eu vejo a comunidade expor um dos seus grandes problemas: a imensa e dolorosa mediocridade que o gamer se encontra.
Eu sei que não deveria partir para insultos rasteiros – uma das minhas resoluções desse ano era tentar ser uma pessoa mais tranquila – porém eu não consigo reagir de outra forma a esse caso. Muito se fala sobre a homogeneização dos jogos da indústria AAA. Seja ela na estética, que atualmente busca ser o máximo ultrarrealista possível, ou seja no estilo de gameplay, que vive de reproduzir o n-ésimo jogo de ação-aventura em terceira pessoa com mira sobre o ombro. O que tenho visto é que não é apenas a indústria que reforça essa mentalidade, o público também a fomenta.
Já tivemos Tomb Raider. Também tivemos Uncharted. Já tivemos até Tomb Raider copiando Uncharted! Agora, aparentemente, precisamos ter o mesmo jogo de novo, porém com a skin de Indiana Jones. Gamers não respondem bem ao diferente, mesmo quando o diferente nem é algo REALMENTE diferente. FPS segue como um gênero popular dos vídeo games, não é nenhum nicho como beat’em ups e aventura point-and-click. Mas isso não importa, porque basta você se desviar minimamente do mainstream atual – ou ao menos o que tem-se como representação do mainstream – que já começa esse repúdio instantâneo por parte da comunidade.
Indiana Jones and the Great Circle é só o exemplo mais recente, porém podemos ficar aqui citando alguns outros casos. Não vamos esquecer as semanas e mais semanas de takes horríveis depois que Baldur’s Gate 3 se tornou um jogo imensamente popular. Eu cansei de ver gamer reclamando do fato dele ser um RPG bom combate baseado em turnos. Cheguei até ver gente querendo que colocassem um sistema de luta alternativo no jogo. Porque, no imaginário de alguns, combate em tempo real é uma espécie de evolução natural do gênero e não apenas um estilo diferente de gameplay.
Quer outro exemplo? Resident Evil 7. Hoje o jogo pode até ser muito elogiado, mas todos aqui vão lembrar que teve muito fã chateadinho antes, durante e depois do lançamento. Diabos, esse pessoal deve tá reclamando até hoje. Tudo porque o jogo não seguiu a linha de gameplay introduzida pelo Resident Evil 4 e que continua sendo replicada nos remakes. Inclusive do próprio Resident Evil 4. Tem até gente querendo um segundo remake do primeiro jogo da franquia, que já tem um dos melhores remakes da história. Embora alguns tentarão argumentar que é porque a gameplay clássica não funciona na atualidade, o que é falso, nós sabemos o verdadeiro motivo. Tiro em terceira pessoa hoje é norma dentro de jogos de ação-aventura.
Alguns podem até tratar as reações ao jogo como uma mera discordância de preferências pessoais. Eu não! Porque para mim já está claro que é um comportamento recorrente. Rejeita-se o diferente pelo simples fato dele ser diferente e, novamente, mesmo que o diferente não seja tão diferente assim.
Indiana Jones já teve vários jogos de de ação-aventura em terceira pessoa e que ninguém mais comenta sobre. Quantas pessoas vocês veem falando sobre, sei lá, Indiana Jones and the Infernal Machine ou Indiana Jones and the Staff of Kings? Se querem tanto um jogo nessa perspectiva, por que não vão jogar esses? Ah, mas aí não dá, né? Aí é jogo velho, datado, envelheceu mal. Todos aqueles termos que o gamer médio aprendeu a falar. Tem que ser coisa nova, afinal qualquer título com mais de dez anos já está praticamente injogável.
Se já estão reagindo assim com uma gameplay tão segura de ação em primeira pessoa, imagina a reação se tivéssemos algo como Indiana Jones and the Fate of Atlantis? O que teria de gamer chorando daria pra produzir um novo dilúvio. Porque esse é o estado não apenas da indústria, mas da comunidade. Não dá pra ter algo minimamente diferente. Não PODE ter algo minimamente diferente. Novidades, ou melhor, “novidades” geram desconforto.
Para que mudar a câmera para primeira pessoa?
Se deu certo pra Tomb Raider e pra Uncharted, por que fazer diferente agora?
É melhor ir no seguro, naquilo que eu já vi, já gostei, já testei e aparentemente preciso de novo porque Deus me livre de haver pluralidade de gameplays nessa indústria.
Vamos padronizar tudo, deixar o mais próximo da média possível.
A mesma cara, a mesma estética, a mesma jogabilidade.
Afinal é na mediocridade que o gamer se sente mais confortável!
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