Modo fácil, uma das discussões mais bobas da comunidade gamer e que deturpa a mais do que necessária discussão sobre acessibilidade
De novo essa merda!

Pensei que hoje eu seria um sábado tranquilo. Pensei. Mas o acaso quis que eu visse um tweet do pior tipo de ser humano imaginável: fã de soulslike.

O comentário não era nenhuma novidade. O mesmo discurso padrão de como jogos que seguem a linha de Dark Souls são feitos para serem difíceis e que adicionar um modo fácil contrariaria a visão do autor e… Blá blá blá. Se não mostro qualquer boa vontade com esse tipo de comentário é porque já não existe um resquício de paciência no meu âmago para essa conversa.

Mas com isso eu não quero dizer que eu não ligo para o tema igual a turminha “pedante games” finge que não se importa (porém sempre comenta) toda vez que ele vem à tona. Eu me incomodo e me incomodo bastante. Meus olhos sempre reviram que a discussão ressurge, só que é por um motivo bem específico. Essa baboseira de modo fácil já está há mais de ano deturpando uma discussão muito válida – e verdadeiramente importante – sobre a acessibilidade em jogos.

Eu costumo dizer que a comunidade gamer não tem uma discussão real sequer. Ainda mantenho essa afirmação evidentemente hiperbólica. Por boa parte do tempo o que vejo é o pessoal gastando energia pelas questões mais superficiais sobre se um jogo é bom ou não é ou qualquer outro flamewar motivado por coitadismo e falta de senso crítico. Fora quando a gente desprende muito tempo brigando com uma opinião boba, ou mal informada ou boba e mal informada. Eu tenho total culpa no cartório nesse caso, mas nunca fui um exemplo a ser seguido. Apesar disso, teve um tempo que a gente chegou bem perto de ter uma discussão de verdade que foi quando surgiu o tema da acessibilidade. Mas como essa é uma comunidade que precisa perverter tudo que é bom no mundo, a conversa logo se centrou no ponto mais imbecil.

É por isso que eu me incomodo tanto quando a pauta volta nas redes sociais. Acessibilidade em jogos está longe dessa ideia de tornar mais fácil de se derrotar um chefão. Ela tem a ver em adicionar recursos que auxiliem jogadores que tenham algum tipo de deficiência física, visual, auditiva, etc; que dificulta a sua experiência. A gente pode pensar em casos mais drásticos como paralisia cerebral que afeta a movimentação dos músculos. Porém daltonismo, por exemplo, também pode ser considerado uma barreira que impede algumas pessoas de aproveitaram um jogo. Esse é um tópico bem abrangente e até a mera adição de legendas ou capacidade de aumentar a fonte do jogo já são recursos para torná-lo mais acessível.

Aliás, eu gosto sempre de recomendar um artigo do BladerKoyotter nessa hora. Ele contextualiza muito bem a história da acessibilidade nos jogos e explica o porquê dela ser tão necessária.

Felizmente o fato de meia dúzia de gamer bocózão que aprendeu a falar git gud não vai impedir que os estúdios busquem adicionar ferramentas que tornem seus jogos mais acessíveis ao público que necessita tanto delas. Até mesmo jogos indie tem levado isso em consideração. Um dos exemplos que conheço é Brok: The InvestiGator (tem texto sobre ele aqui no blog) que esse ano adicionou recursos para ajudar jogadores cegos. Mesmo assim eu acho que a conscientização da comunidade ajudaria muito na compreensão do porquê é tão importante essa inclusão. Saber nunca é demais, principalmente quando envolve entender dificuldades que não competem a nossa vivência.

Só que aí quando as coisas parecem que vão progredir, voltamos de novo a estaca zero com uma briga boba de egos. De um lado o jogador que exageram em muito a real dificuldade de um jogo e do outro alguém cujo o único traço de personalidade parece ser o ter zerado um soulslike. E em algum momento um ou ambos os lados solta essa palavra levianamente no meio da discussão.

ACESSIBILIDADE NÃO É ISSO, CACETE!!!

Eu até consigo dar um pouco, muito pouco, de boa vontade com quem diz que modo fácil é um dos recursos da acessibilidade. Contudo ainda discordo e acho errado relacionar as duas coisas. Porque ele não resolve nem metade das barreiras que PCDs tem em jogos. Além disso, muitas das formas de tornar jogos mais acessíveis nem mesmo envolvem dificuldade. Para mim, colocar modo fácil nesse contexto é reduzir em muito o tema, pois ele ajuda mais os jogadores que não tem qualquer necessidade de ferramentas de acessibilidade. Indo mais além, acho que também cria um precedente para empresas fazerem apenas o básico e clamar que seus jogos são mais acessíveis.

Portanto o que precisamos de fato discutir é a inclusão de opções de mapeamento de botões, de mudança de cor e alto contraste, audiodescrição, assistência na mira, quick time events opcionais ou aumento do tempo de reação, etc. Existem diversas medidas que pode-se tomar para deixar a experiência de jogo mais agradável para uma gama de jogadores que não envolve mexer na dificuldade. Também podemos discutir sobre precificação de jogos afinal também existe toda uma pauta sobre acessibilidade financeira mundo a fora.

Só parem, parem pelo amor de Deus, de achar que o que a gente está precisando nessa maldita comunidade é um modo fácil em Darks Souls!


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